Digo muitas vezes, e acredito, que temos mais medo de ser felizes, de ter sucesso, de que as coisas corram bem, do que propriamente de falhar, de cair, de não conseguirmos atingir os nossos objectivos ou não encontrarmos a tal felicidade. Digo-o muitas vezes, e acredito, ainda que, constantemente, em resposta a esta expressão, eu receba um “não concordo” ou um “não é bem assim”. No entanto, quanto mais o tempo passa, quantas mais situações eu vou vivendo, vendo e experienciando, mais me convenço de que sim, estamos tão configurados para sermos iguais uns aos outros que o simples acto de querer ser diferente (e tantas vezes ser feliz, independentemente de tudo o que aconteça, é ser diferente) transporta até nós um medo inconsciente, irracional, mas muito profundo.
Olhamos para o sucesso, para a felicidade, para um objectivo que pretendemos atingir, uma pessoa que queremos encontrar para ter um relacionamento, um trabalho que nos realize, não como uma escada contínua onde, degrau a degrau, vamos escalando e reajustando o nosso caminho, mas sim como uma meta a atingir, que depois queremos manter intacta, pois as nossas zonas de conforto assim o impõem. No entanto, esquecemo-nos que felicidade, satisfação, alegria, realização, não são coisas do foro material ou da dimensão física em que vivemos, mas sim dos domínios do espírito. Desta forma, quando não reconhecemos a dimensão espiritual do nosso ser, transportamos para esses propósitos uma materialidade que não se lhes pode ser ajustada, pois é mais fácil, num mundo onde somos levados a ser carneirinhos num rebanho, manter essa imutável ilusão.
Ser feliz, ser bem-sucedido, conseguir atingir tanto do que pretendemos, e até mais, implica compreender que tais coisas não podem ser objectivos ou metas, mas sim formas de estar, de viver, de existir. Alguém que tem como objectivo ser feliz, na verdade, nem sequer sabe o que isso significa, pois nem sequer compreende que tal sempre esteve ao seu alcance, como sempre está, mas que tal também implica olhar para a vida como um processo, como um caminho, e compreender que cada coisa está no sítio certo e na hora exacta nas nossas vidas, cada vivência de dor, cada sorriso, cada alegria, cada perda, todos têm um propósito, o da nossa evolução, o da aprendizagem, o do crescimento.
No fundo, se o medo é a ausência de Amor, então, quando temos medo de ser felizes, da mesma forma que temos medo de falhar, temos, na verdade, falta de amor pela vida, falta de amor por nós mesmos, por quem somos, pelo propósito que escolhemos trazer à Terra, pois tão importante como amar aquilo que nos faz sorrir, ou talvez ainda mais, é amar aquilo que nos provoca dor. Nesse momento, quando tal somos capazes de abraçar, entregamo-nos à beleza e à magia da vida, escolhemos arriscar, divertirmo-nos, relaxar, experienciar, sentir o que cada situação nos traz, assumindo a responsabilidade, sempre, de cada um dos nossos actos e escolhas.
Na realidade, acredito também que temos medo de ser felizes pela responsabilidade que tal implica, ou que achamos que em nós tal carrega. Cravamos nas nossas costas um peso dum sucesso, duma felicidade, como se tal tivesse que ser perpétuo e imutável, esquecendo-nos que o que hoje para nós é sucesso, amanhã pode não o ser, e mantê-lo acaba por ser o construir duma enorme prisão de alta segurança que deixa muito confortável o nosso ego, mas em que a nossa alma sofre. Como seres em evolução constante e perpétua, na missão suprema de nos reunirmos com o Todo num ponto da nossa evolução, fechando um ciclo e abrindo outro, quando tornamos tais conceitos em peças físicas, em metas e objectivos, esquecemo-nos que, na verdade, eles são moléculas de nós mesmos, são partes de um propósito, de um caminho, formas de ser e de estar, que não se cingem aos acontecimentos da vida, mas sim que os moldam, em cada momento.
Ser feliz, ser bem-sucedido, crescer e evoluir, nesta perspectiva, é conseguir olhar para cada pequena e singular situação como uma dádiva do Universo, tenha ela como resultado um sorriso ou uma dor, um reconhecimento ou uma queda, é ter a capacidade de sermos gratos pelo maior dom que Deus nos deu e ao qual nos propusemos, o dom da vida, e que cumpri-la é deixar o medo de parte e abrir os braços e o coração para o que ela nos traz, aceitando sem passividade, rendendo-nos mas não nos resignando, procurando sempre mais, mas reconhecendo que tudo tem o seu momento certo, a sua hora exacta. Dessa forma, acredito, deixamos de ter medo de sermos felizes, deixamos de ter medo de sermos nós mesmos.