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Do Caos à Perfeição: A Via do Silêncio

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Vivemos num mundo muito barulhento, com muito ruído, com tanta coisa a acontecer, tantas solicitações, obrigações e responsabilidades. Por vezes, surpreendentemente, o ruído exterior consegue ser inferior ao que existe dentro de cada um de nós, pois, quando a mente se deixa alimentar por todas estas coisas que a rodeiam, cria ligações e conexões tão fortes e intensas que suplantam todos os movimentos gerados pelo próprio ser humano. O problema é que, num mundo tão racional e ainda tão desconectado duma vivência espiritual, essas ligações e conexões despoletam medos, ansiedades, vivências espelhadas no futuro, que nos vão destruindo e nos consumindo, reduzindo a vida que temos e transformando-a em sobrevivência.

Sermos capazes de ouvir os nossos silêncios é crucial no reencontrar de nós mesmos, no recentrar do nosso ser e nesse processo tão importante que é o de largarmos os mecanismos de sobrevivência, em segurança, e abraçarmos a verdadeira vida, aquela que escolhemos percorrer com um propósito aqui na Terra. Por vezes, para ouvir estes mesmos silêncios precisamos de abraçar o caos que as situações da vida nos trazem, precisamos de encontrarmo-nos no centro dessas mesmas vivências e compreender o porquê de elas estarem no nosso caminho. O problema é que a nossa natureza mental, perante um problema, tem tendência a envolver-se, a deixar-se levar, a mesclar-se e a projectar-se com ele, como um vector sobre o qual nos desenvolvemos, o que, invariavelmente, amplifica o caos, os medos e tudo isso nos retira de nós mesmos.

O caos é uma poderosa vivência, que tem a capacidade de nos libertar, de quebrar barreiras e de nos elevar, se assim lhe permitirmos, pois são os caos os grandes construtores do Universo e da vida. Na verdade, hoje sabemos que, sem grandes acontecimentos caóticos neste nosso planeta a vida não teria sido possível, a vida humana não existiria, pois eles foram, ainda que catastróficos, grandes balanceadores energéticos, reestruturantes e reequilibradores duma harmonia que ultrapassa, muitas vezes, o nosso entendimento racional, mas que, sem dúvida, é reveladora duma perfeição única e sublime que só o nosso sistema nos sabe oferecer.

Tudo o que nos sistemas, no macro-cosmos, que nos rodeiam e a que pertencemos, é, ao mesmo tempo, o reflexo e o espelho do micro-cosmos que nós próprios somos, é necessário entender que nem tudo o que parece confusão realmente representa algo fora do lugar ou desajustado. Na realidade, quando olhamos atentamente, percebemos que, no Universo, como na natureza deste planeta que nos acolhe, nada vive no acaso, nada está fora do lugar, tudo se integra numa magnífica e oleada máquina que funciona na mais plena harmonia. Então, com esta consciência, podemos perceber que o caos é um caminho, uma pedra em bruto que espera ser burilada e que dela precisamos de, pacientemente, saber extrair o mais precioso dos diamantes.

Para sairmos do caos, necessitamos de voltar ao nosso silêncio, precisamos de mergulhar dentro de nós mesmos e ouvir-nos, compreendermo-nos e entender que cada uma das vivências caóticas é como uma espécie de chave, essencial para a construção da nossa própria individualidade, para o cumprimento do nosso propósito. Quando entendemos a sua origem, o seu potencial e a sua razão de ser, ultrapassamos o tempo e o espaço das nossas vidas e integramos toda a compreensão do nosso ser naquele pedaço de alma que necessita de ser trabalhada e curada para, desta forma, ser resgatada na sua essência e reestabelecida no nosso Eu.

Noutros tempos, os Eremitas recolhiam-se em busca de si mesmos, da sabedoria, lidando com os dilemas e os caos do seu próprio ser. Eles mergulhavam nas suas sombras para se descobrirem, para se iluminarem, para resgatarem a luz da sua essência e se revelarem perante si mesmos, numa profunda jornada espiritual. Estes Eremitas podiam ser peregrinos, monges das mais diversas religiões, iniciados em busca da mestria, ou outra qualquer coisa, mas o que eles todos tinham em comum era a entrega a si mesmos, aos seus silêncios, por escolha própria, por necessidade ou por devoção.

Quando enfrentamos o nosso caos, encaramos as partes de nós que precisam de cura, que necessitam de ser devidamente iluminadas, que precisam da nossa atenção, do nosso carinho e do nosso amor. O caos é revelador e ensina-nos tanto que, quando ele passa, quando a tempestade acalma, continua a mostrar-nos coisas. O caos é generoso, pois ele dá-nos tantas coisas para que possamos avançar, presentes às vezes um pouco toscos, é um facto, mas que escondem riquezas em si mesmos, que só com paciência e muito amor poderemos descobrir. O caos é a flor inesperada que surge no cacto em plena e profunda seca, que não deixa de ser bela por estar em tão inóspito ambiente, mas que pode passar ao lado quando apenas vemos a secura e a aridez.

A via do silêncio, dos nossos próprios silêncios, é a verdadeira via da perfeição. É ela que nos permite entendermo-nos a nós mesmos, a encontrarmo-nos dentro de nós, a reconectarmo-nos não só com a nossa essência, mas também com a Terra e o Universo, com a Mãe Cósmica e o Pai Cósmico. Entendemos, assim, que somos canais, perfeitos no nosso próprio caos, perfeitos na nossa essência e na sua manifestação, quando entendemos que cada vivência é um potencial de crescimento, que o silêncio não é aquele vazio assustador que às vezes nos é transmitido, que pode ter tanta beleza em si, como a da música que nos pacifica e nos alimenta a alma, como o campo cheio de flores, a floresta de árvores frondosas ou o mar imenso que nos presenteia com as suas ondas. Contudo, tal só é possível quando, nesses silêncios, somos capazes de nos reflectir, de nos ouvir, de em nós caminhar, em profunda e verdadeira peregrinação pelo universo do nosso ser.

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