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O Sentido do Caminho

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Quando começamos a mergulhar e a olhar para dentro de nós, a fazer caminhos de autoconhecimento e de desenvolvimento pessoal, parece que o trabalho é infindável, que estamos sempre a fazer mais e mais coisas, que nunca conseguimos fechar um tópico e que há sempre alguma coisa extra. O mesmo se passa com os desafios e processos que a vida nos coloca, que parecem infindáveis e, às vezes, até intransponíveis. Não é inteiramente mentira, mas também não precisa, nem pode, ser vivido nesta pressão, nesta exigência, dor e sofreguidão.

É certo que o caminho na Terra, neste plano e na encarnação, é um trabalho contínuo, como uma escada que, degrau a degrau, necessitamos de subir. Esse é o projecto da Terra, como grande escola que é, o de nos proporcionar as condições para podermos desenvolver o nosso espírito, para podermos trazer a nossa centelha divina e manifestá-la, para podermos evoluir. No entanto, embora este caminho nos traga esta importância e esta magnitude, em momento algum ela tem de ser, obrigatoriamente, de ser vivida no peso do sofrimento, da obrigação e da exigência.

Ao estarmos na densidade da matéria, existem um conjunto de necessidades que a este plano nos solicita, que passam por coisas tão simples como preservar a nossa existência, subsistir, ter condições básicas para a sobrevivência, como comida, casa ou roupa. Por estarmos também a viver na matéria, o nosso foco de desenvolvimento foram os seus recursos, e assim crescemos, com a necessidade da posse e de abundância, mas também com os seus opostos, a perda, a carência e a escassez. Este, de certa forma, desequilíbrio construiu-nos e moldou a nossa existência, criando, entre muitas outras coisas, uma ideia de sacrifício constante, de rigidez, de exigência e obrigação, tivéssemos, ou não, condições materiais e financeiras.

Crescemos com este sentido de obrigação, que ouvimos nas coisas mais simples do dia-a-dia, como uma espécie de mantra transmitido de geração em geração, que nos condicionou e nos moldou nos nossos percursos. Sentimo-nos, muito vulgarmente, imperfeitos e insuficientes, mesmo sem ter disso consciência. Isso levou-nos a algo nefasto, a inclinação para dar um excesso de importância às mais ínfimas coisas menos boas que se passam, aos problemas, aos desafios, às vicissitudes e aos obstáculos, mas a apenas considerar válidas as grandes conquistas, as grandes vitórias, ignorando todas as outras. Com o tempo, vamos acreditando que não somos merecedores, que alguma coisa boa foi derivada de sorte e que o que nos dão é por puro interesse, enquanto nos culpamos e castigamos pelas coisas mais básicas e pequeninas. O mais interessante desta realidade é que está intrínseca no nosso ser, tão cravada na nossa identidade, na nossa existência, que nem sequer dela nos apercebemos, nem temos dela consciência.

A vida é composta de processos, de desafios e escolhas, sem dúvida, muitos deles são grandes obras que necessitamos de desenvolver, mas não têm de ser levados com mais peso do que já, naturalmente, têm. No entanto, é isso que fazemos, precisamente por este conceito profundo de obrigação que alimentamos em nós, em que somos modelados e em que crescemos. O mais interessante, até, é que, quando iniciamos um caminho de autoconhecimento, de desenvolvimento pessoal e espiritual, estes conceitos tornam-se ainda mais fortes, pois ganhamos mais consciência e, com ela, mais responsabilidade de os desmontarmos e de nos reajustarmos.

Os desafios são parte do processo e do caminho, não surgem porque, de repente, começámos a trabalhar sobre nós, apenas se tornam mais conscientes e visíveis. Às vezes até pensamos que a ignorância é uma bênção que nos impede o sofrimento, mas o que não percebemos é que ela é apenas um véu que não nos permite crescer, nem evoluir. O desafio está lá e sempre estará, independentemente de o vermos ou não. Contudo, adquirirmos essa mesma percepção exige que sejamos capazes de perceber uma outra realidade da vida e do caminho na Terra, do nosso percurso enquanto espíritos numa experiência humana.

Não viemos à Terra para sofrer nem para estar sempre em processos atrás de processos. Viemos à Terra fazer um caminho onde esses processos são etapas e parcelas importantes do trilho. O que faz a grande diferença é a forma como damos os nossos passos e, nesse aspecto, temos sempre a tendência para carregar o peso da exigência, da imperfeição e da obrigação nos ombros, um reflexo da nossa formação social baseada numa perspectiva judaico-cristã, onde o sofrimento é-nos mostrado como um caminho para a salvação. Contudo, é preciso recordarmos que o grande ensinamento dos Mestres foi o Amor, e é nele que precisamos de dar cada passo neste percurso.

O Amor não é sofredor nem exigente, ele é verdadeiramente simples e, ao mesmo tempo, profundo, pedindo-nos que olhemos os nossos passos através da vibração que colocamos no nosso ser, e se o fazemos nessa vibração pesada e densa, então a vida é um calvário de constantes provações e dificilmente mudará. Porém, se conseguirmos trazer esse verdadeiro Amor ao nosso coração, se conseguirmos, apesar de todas as provações e dificuldades, encontrar pequenas, mas importantes, coisas que a vida, todos os dias, nos oferece, então o caminho far-se-á de forma substancialmente diferente.

Na verdade, e se formos muito honestos connosco, vamos compreender que passamos maior parte da vida sem olhar para as coisas mais simples que estão à nossa volta e que são maravilhosas dádivas. Se nessas pequenas coisas conseguirmos ver beleza e vibrar, como uma flor, um arco-íris no céu, um “bom dia” vindo de um estranho ou um sorriso que alguém nos dá, uma gargalhada duma criança, um amigo que nos diz que gosta de nós sem estarmos à espera ou, se quisermos ser menos idílicos, uma qualquer, mesmo que pequena, superação que conseguimos ou o atingir de algo que há algum tempo ambicionávamos, então mudamos uma parte substancial da nossa realidade, porque fazemos um ajuste nas nossas lentes.

Assim como no meio dos espinhos de um cacto nasce uma flor de beleza incomparável, também, por muitos desafios e obstáculos que a vida contenha, existe um espaço em nós e uma razão para celebrar, para sorrir, para agradecer.

Com isto é também necessário compreender que entrar no extremo é também uma forma destrutiva. Não encarar nem assumir a importância das coisas, ignorar a sua gravidade ou urgência, ou simplesmente entrar num bypass espiritual em que ultrapassamos as emoções densas que a realidade das coisas nos coloca, achando que tudo é bonito, divino e, até, superficial, é perigoso e inconsequente. No entanto, é muitas vezes assim que vivemos, nos extremos da suposta luz e da suposta sombra, ignorando a riqueza de tons que a vida contém em si mesma.

Ainda que o caminho seja repleto de desafios, de obstáculos, de camadas às quais precisamos de aceder, de degraus que, um após o outro, precisamos de subir na escada da vida, o que nos é pedido é que aprendamos a caminhar em amor, em gratidão, em fé e esperança, mas, acima de tudo, em profunda consciência do que cada etapa nos solicita. Esquecemo-nos, com o tempo, com a vida, com as exigências que constantemente nos são colocadas, de olhar para dentro de nós em gratidão e celebração. Até podemos olhar para dentro de nós, mas muitas vezes fazemo-lo com a mesma vibração com que antes víamos a vida, com exigência, com densidade, com obrigação. Contudo, a vida é, por si mesma, abundante, rica e bela, mágica em cada partícula da sua existência, um verdadeiro milagre que esquecemos frequentemente.

Se conseguirmos receber em nós as pequenas coisas belas e subtis que a vida nos dá constantemente, mas que muitas vezes não vemos, se delas nos formos alimentando, vamos começar a dar maior magnitude às outras, maiores, mais elevadas, aquelas que, muitas vezes, chegam a nós e que, embora nos preencham, passamos à frente, pois não podemos perder tempo. Se conseguirmos sentir-nos merecedores da riqueza que a vida, constantemente, nos oferece, faremos dessa energia matéria-prima do nosso crescimento. Quando o fazemos, alimentamos o nosso coração com a sua vibração e deixamos de percorrer o caminho com o olhar fechado no chão, em busca das pedras e dos desafios, passando a andar de olhar erguido, focado no propósito e aproveitando todas as coisas que nele existem.

O caminho da vida é também uma aprendizagem de celebração, de abertura do nosso coração para receber o que ela tem para nos oferecer. Assim como no meio dos espinhos de um cacto nasce uma flor de beleza incomparável, também, por muitos desafios e obstáculos que a vida contenha, existe um espaço em nós e uma razão para celebrar, para sorrir, para agradecer. A gratidão que tanto se fala, que tanto se apregoa, tem de ser, na verdade, um momento de celebração, um largar de capas e armaduras, um rasgar de véus e, assim, um redescobrir da nossa própria luz, da força da nossa centelha e do nosso espírito. É nessa consciência que largarmos o excesso de peso que suportamos, tiramos coisas que não são nossas das mochilas que carregamos, e percorremos o caminho da vida com maior leveza, não porque retirámos dela etapas ou desafios, mas sim porque vamos compreendendo melhor, a cada passo, o seu sentido.

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Comments (1)

Margarida Marmelo

Tão linda esta reflexão! 💖obrigada 🤩

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