Na Terra, neste plano que nos acolhe e em que desenvolvemos o nosso caminho e o nosso propósito, algo só existe, verdadeiramente, quando se manifesta, de alguma forma, na matéria. Isto significa que podemos ter uma vontade ou uma ideia, e ainda que tal seja importante e relevante, não passará disso se não tivermos a capacidade de a trazer para o concreto e para o real. Contudo, esta passagem é, muitas vezes, dolorosa, pois ela implica vivenciar a possibilidade de erro e de falha ou experienciar a ausência de controlo sobre o que pode surgir e desenvolver-se, algo que nos tira da nossa zona de conforto e que activa medos em nós.
Uma ideia, uma vontade, uma faísca de originalidade e de utopia, é como uma semente que temos guardada. Podemos saber qual a sua espécie e, com isso, ter a percepção de que planta irá gerar, que folhas terá, que flores irão dela desabrochar e que frutos dela nascerão. No entanto, se a semente não flor plantada, não entrar na terra e não for germinada, ela não passa dum potencial, duma ideia de algo que poderá nascer, duma vontade, mas não existe nessa forma, apenas na possibilidade que nos apresenta.
Na nossa vida, tal também é verdadeiro e muitos de nós convive com essa realidade em si. Ideias fervilham dentro da mente, vontades e projectos fazem o nosso coração bater mais forte, apenas pela simples possibilidade do que elas significam para nós, das portas que poderão abrir, dos caminhos que com elas poderemos fazer. No entanto, no momento seguinte, a incerteza preenche os espaços disponíveis, o medo contrai o nosso plexo solar e, tantas vezes, perante essa impotência de termos a certeza dos caminhos que poderão ser feitos, bloqueamos essa vontade, guardamos os projectos dentro duma gaveta, onde acabarão esquecidos, no meio de tantas outras coisas das quais desistimos.
O medo é uma força poderosa que se alimenta do passado, das feridas abertas, dos erros e falhas que, pelo percurso, fomos experienciando. Contudo, ele alimenta-se de tudo isso pela forma como nós olhamos o caminho e cada uma dessas situações pelas quais passámos. Todos nós, de certa forma, damos mais valor ao que foi, na nossa percepção, negativo e mau, a tudo o que nos indica que há algo a aperfeiçoar e a melhorar. Por vezes até exacerbamos essas percepções ou as críticas que chegam até nós. Fazemo-lo pela ânsia de sentir, de viver emoções, e estas, mais densas, são mais intensas no seu efeito. No fundo, estas experiências mais negativas são um pouco como os alimentos com açúcar, que nos dão a ideia de estarmos saciados, que nos preenchem vazios, mas que são muito pouco saudáveis (e, na verdade, pouco tempo depois voltamos a ter fome).
Temos muita pressa de ver um resultado e, com isso, esquecemo-nos que o que é mais importante é todo o caminho feito. O resultado é a consequência e o efeito de todos os passos que demos, não da ideia inicial, até porque, em algum momento, essa ideia pode ser modificada ou ajustada pelos factores que nos são colocados.
Para nós, neste plano denso e intenso, é muito difícil olharmos as coisas “boas” da mesma forma como olhamos para as “más”. Todos nós fomos ensinados a valorizar as coisas negativas, sempre sob a ideia de que somos imperfeitos, incompletos e impuros. Melhorar é sempre o objectivo e o propósito, mas é gerado e criado sob a égide da falha e do erro. Por isso, muitas vezes, preferimos não tentar, não fazer, não arriscar e ficar presos ao que já conhecemos, às estruturas que já nos deram um dia conforto e segurança, mas que agora são apenas apego e vício, do que darmos um salto de fé, do que nos entregarmos à paixão de irmos em busca do que alimenta a nossa Alma.
Por isso, também, preferimos iludir-nos com a ideia da incapacidade, rendendo-nos ao medo e, por consequência, à frustração do que poderia ter sido. O medo é poderoso, pois prende-nos nos extremos, colocando o nosso coração como seu refém e substituindo a sua luz pela escuridão que o alimenta em cada momento. O maior problema é que o medo faz parte da experiência e é uma criação exclusivamente nossa, alimentada pelo que nos foi ensinado, assim como pelas experiências que a vida nos ofereceu. No entanto, essa mesma condição é também uma oportunidade, uma porta que pode ser aberta a qualquer momento, desde que tenhamos em nós a chave para a poder abrir.
Neste plano, algo só existe quando se manifesta na matéria, quando ganha forma e quando o alimentamos em nós, nos nossos corações. Até esse instante em que começa a ganhar forma, é apenas uma ideia, uma vontade. Então, o segredo é conseguir, de forma concreta, dar um passo em frente, colocar a “mão na massa”, agir e começar a concretizar. É nesse passo que algo se revela, que o caminho se começa a construir e que começamos a compreender, verdadeiramente, o que estamos a construir. É esse primeiro passo que inicia o dissipar do nevoeiro, que inspira a nossa própria capacidade de criar e coloca os medos no seu lugar certo.
A questão com que temos de nos debater, para além do medo, é a nossa ansiedade de fazer tudo bem à primeira, de sermos perfeitos nos nossos propósitos e de, como por artes mágicas, ter tudo feito num instante. Temos muita pressa de ver um resultado e, com isso, esquecemo-nos que o que é mais importante é todo o caminho feito. O resultado é a consequência e o efeito de todos os passos que demos, não da ideia inicial, até porque, em algum momento, essa ideia pode ser modificada ou ajustada pelos factores que nos são colocados. É o medo de falhar que nos fixa nesse ponto final que chamamos de resultado e que, se não for devidamente dominado, bloqueará, em algum momento, o nosso próprio caminho. Contudo, é com o primeiro passo que o medo se pode tornar um aliado, um simples alerta de perigos e obstáculos, que nos trava a ânsia e nos pode, na verdade, serenar o espírito.
É por isso essencial que estejamos em sintonia com o nosso coração, com a nossa essência, pois é nessa vibração que somos capazes de abraçar cada passo como um resultado e renovar a nossa ideia e propósito em cada instante. É também assim que vivenciamos a celebração de cada passo conquistado e recebemos essas vitórias exactamente da mesma forma com que recebemos uma derrota ou uma crítica mais mordaz: em profundo amor por quem somos e pelo que nos move. No fundo, o segredo é esse mesmo, estarmos em sintonia com o que nos move e compreender se essa força respeita e segue os nossos valores mais basilares e fulcrais.
Então, precisamos também de aceitar o nosso tempo, assim como o tempo de cada coisa que de nós tem a capacidade de nascer. A semente não nasce mais rapidamente porque estamos a olhar para ela, mas sim porque a nutrimos e cuidamos com amor. Da mesma forma, as nossas ideias e projectos, as nossas vontades, têm um tempo certo para nascer, crescer e dar frutos. É nesse crescimento que compreendemos o seu verdadeiro propósito e o caminho que com ela queremos percorrer. No final, pode até não servir para o que achávamos no início, mas pode abrir outra porta ou fazer nascer outra ideia. Aquilo que chamamos de falha pode ser apenas o ponto de partida para algo muito mais interessante e importante.
No entanto, nada existe sem esse primeiro passo, sem que a vontade se torne acção e, consequentemente, abra espaço para que algo se materialize. Este é o segredo dos grandes mestres artesãos e dos grandes inventores, levarem as suas ideias até à concretização pelo caminho da descoberta, do desbravar dos trilhos da mente. Arrisco mesmo dizer que nenhuma obra alguma vez realizada tem o aspecto exacto do que inicialmente passou na cabeça do seu criador. Se estivermos em sintonia com o nosso coração, haverá sempre um pequenino ponto que nos revela um outro caminho, uma alternativa que faz mais sentido e que, no final, revela ser o que realmente precisávamos. Contudo, a maior verdade é que a obra não existiria, de todo, sem que, depois da vontade e da ideia, o criador desse aquele primeiro passo para a sua manifestação e materialização.
A criação nasce da vontade do criador, da ideia de que nele se nutre e se alimenta, mas só existe quando ele se permite trazê-la ao concreto e ao real. É nessa contemplação preciosa, vivida em cada instante, que a criação ganha forma e se revela em todo o seu potencial. Quando deixamos de olhar para um suposto resultado e começamos a estar em profunda atenção ao caminho, tudo se manifesta e materializa exactamente no que foi desenhado para ser, mas não necessariamente no que idealizámos, no que imaginámos ou em algum momento pretendemos. A magia da criação não reside num resultado, mas sim no próprio acto que é o criar, a partícula que Deus deixou em cada de nós, que nos coloca à sua imagem e semelhança, e que se manifesta pela vontade e pelo mais profundo e belo amor.
Muito obrigada por esta reflexão tão importante e ótima! 🙏