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Caminho Interior

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Quando são vividos processos de grandes mudanças e transformações, a primeira reacção que o ser humano, naturalmente, tem é de resistência e de tentativa de manter o que antes ofereceu segurança e estrutura. Esta reacção é instintiva e imediata, pois mesmo que sejamos muito ávidos de mudanças, mesmo que nos sintamos bem e até desejemos essa ideia de transformação, este processo representa um quebrar de algo que conhecemos e que, acreditamos, temos controlo. Isto despoleta um conjunto de questões em nós que têm a ver com a existência na matéria, com as “regras” que este plano em que vivemos nos solicitam.

A experiência terrena implica a vivência dum conjunto de estruturas materiais. Temos um corpo físico, composto de elementos que lhe dão fundamentos, forma e função. O mesmo se passa em relação a tudo o que nos rodeia, seja uma árvore, uma pedra, um animal ou até mesmo o que somos nós, seres humanos, a idealizar e construir. Tudo se rege por essa tríade que encontramos bem espelhada nos signos do elemento Terra no Zodíaco: Capricórnio dá-nos o fundamento, a estrutura e a direcção; Touro nutre a forma, dá-lhe corpo e valor e inspira-lhe a emoção da segurança; enquanto Virgem confere-lhe função, sentido, utilidade e propósito de utilização dos seus recursos e capacidades. É esta dimensão elemental que, em ligação com as dos outros elementos, cria a vivência terrena.

Contudo, esta necessidade absoluta de matéria é complexa. Precisamos de uma função e uma utilidade, dum sentido de aperfeiçoamento, mas é fácil prendermo-nos no looping da ilusão do perfeccionismo e tornarmo-nos destruidores das nossas próprias capacidades. Ao mesmo tempo, necessitamos de valor, de nutrição, alimento e segurança, mas é muito simples agarrarmo-nos à posse e ao poder como forma de os manter, corrompendo-nos na nossa própria capacidade de gerar prosperidade através da abundância que está inscrita no espírito que nos habita. Precisamos de estruturas, regras e ordem, pois elas dão-nos uma sensação de solidez e protecção, mas é tão simples cristalizarmo-nos nessas ideias e em tudo o que elas significam.

Esta simples descrição, um pouco conceptual, sem dúvida, dá-nos algumas ideias sobre o mundo que vivemos neste momento e o que ele nos mostra sobre nós mesmos. Os últimos anos trouxeram o quebrar de muitas estruturas e sinais muito fortes de mudanças de paradigmas que nos têm regido até aqui. O sistema económico e financeiro mostra, cada dia mais, a sua fragilidade e inadequação à realidade que o desenvolvimento humano tem trazido, enquanto os vários sistemas sociais que nos sustentam, como a saúde, a educação, a habitação e a protecção social, se mostram totalmente desajustados do ponto de evolução e necessidade das pessoas. Isto leva a um aprofundamento de desigualdades, não só dentro das sociedades, mas também entre elas, entre povos, países e nações, algo que as gerações mais novas começam a olhar e a questionar, pedindo, com urgência, mudanças que os poderes têm dificuldade em responder, quando assim o desejam fazer!

É fácil tornarmo-nos naquilo do qual fugimos, naquilo contra o qual mais lutamos, não por fazermos as mesmas coisas, mas sim por agirmos da mesma maneira.

É esta realidade que nos acompanha, mas que tem levado, nos últimos anos, e com especial destaque para os últimos meses, a um crescimento de algo que é preocupante. Hoje, quando olhamos o mundo à nossa volta, vemos a acontecerem um conjunto de coisas que nos recordam outros tempos. Nas nossas próprias vidas, se estivermos atentos, conseguimos compreender ciclos, vivências que se repetem, não como um padrão, mas como uma espiral de crescimento e de desenvolvimento, aprendizagens que nos são propostas e que nos chegam consoante o nível de consciência que comportamos. No mundo que nos rodeia, também conseguimos ver esta mesma realidade, com determinados comportamentos globais, posturas e valores que nos fazem recordar tempos sombrios da nossa história, que trazem ao de cima um conjunto de questões que necessitam, mais uma vez, duma forma diferente, de serem trabalhadas.

O quebrar de estruturas que temos vivido tem activado a ideia de perda dum conjunto de estruturas que nos têm dado sustento ideológico e energético. É daí que surgem os nacionalismos exacerbados e as discriminações, que não são mais do que a expressão mais instintiva e irracional de medos que nos têm sido alimentados por determinados agentes que necessitam do caos que é destes movimentos gerado para se poderem nutrir e ganhar poder. No entanto, o movimento de mudança que estamos a viver é inevitável e, como em todos os grandes processos de transformação que já vivemos nesta Terra, há sempre um tempo de transição que traz turbulência, dúvida, medo, desespero e radicalismo. Se, dum lado, há quem esteja na frente destes movimentos de mudança e puxe para a concretização desse novo caminho, com tudo o que ele implica, há também quem tenha medo, quem não queira que nada mude, quem puxe para o outro lado, para o conservadorismo, para a tradição.

Embora esta realidade seja constante em todos os momentos, o problema que ela coloca neste tempo tem a ver como todos estes processos são vividos, pois eles são reflexo do que se passa dentro de cada um de nós. Estamos em pleno impulso de transição dum tempo longo em que o elemento Terra foi o fundamento do nosso crescimento e desenvolvimento para um novo tempo, também de grande evolução, mas cujo princípio é o Ar. Nos últimos quase três séculos construímos riqueza, evolução a todos os níveis, desenvolvimento nas mais diversas áreas, atingimos, enquanto humanidade, coisas que só estavam na nossa imaginação., trazendo-nos riqueza e evolução a todos os níveis, mas cujo preço está à vista com as desigualdades que encontramos tão claras, com os jogos de poder manietados por pessoas que se esqueceram da fragilidade da vida e da sua regra mais básica, a limitação de tempo.

O que nos está a ser pedido ainda é pouco claro, é certo, mas podemos compreender como um levantar da nossa voz, um trazer de ideias, conceitos, ideais e projectos que nos façam olhar para a nossa humanidade de forma diferente e, através dessa mesma diferença, tornarmo-nos verdadeiramente criadores, evoluindo através dum novo caminho e duma nova dimensão, mais empática, de respeito, aceitação e compreensão, de partilha e inovação. No entanto, para que isto aconteça, precisamos de sair duma necessidade absoluta da posse e do poder e compreender que a matéria serve-nos e não o contrário, mas que, para isso, precisamos de a respeitar nas coisas mais simples e básicas, como o nosso próprio planeta, a primordial Mãe Terra. Nada nem ninguém nos pede que voltemos a uma vivência quase primitiva, que percamos qualquer tipo de conquista (e é esse o medo que tem sido amplificado), bem pelo contrário, mas sem largarmos determinados conceitos e ideias, não vamos conseguir evoluir muito mais do que já atingimos. É neste propósito que tudo o que este tempo nos pede se inclui e se dimensiona.

Estes tempos que vivemos, tão desafiadores, onde vemos certas feridas de gerações passadas a reaparecerem e a inflamarem, onde vemos radicalismos a brotarem e a serem alimentados, são também um momento de filtragem. É preciso separar as águas para que o lixo possa ser visto, identificado e limpo. É preciso, muitas vezes, que haja divisão, para que se compreenda e se impulsione o que nos pode unir, mas também para que cada um possa colocar-se no seu lugar “certo”, para que cada um possa encontrar uma voz. O que vemos no mundo que nos rodeia é que esta divisão está a existir, mas poucos compreendem que ela tem uma consequência, que tudo implica responsabilidade e que cada acção gera uma reacção, mas também um certo preço a pagar. Por isso estes tempos são tão importantes, pois eles dão-nos a oportunidade de olharmos mais profundamente para nós e compreendermos qual é o valor que estamos dispostos a pagar. É fácil tornarmo-nos naquilo do qual fugimos, naquilo contra o qual mais lutamos, não por fazermos as mesmas coisas, mas sim por agirmos da mesma maneira.

É por isso crucial compreendermos que estes são tempos de nos tornarmos grandes observadores de nós mesmos, de mergulharmos profundamente dentro de nós, nas nossas feridas, medos, comportamentos e acções, para conhecermos, não só, a nossa voz, mas também o que nos move e quais os passos que pretendemos dar. Sem dúvida que somos muito afectados por tudo o que nos rodeia. Quando vemos as guerras que estão tão próximas, quando vemos as desigualdades que nos envolvem, quando percebemos que existe tanta morte, destruição e fome dum lado, mas que do outro se desperdiça comida e ainda há quem se aproveite das fragilidades alheias, tudo isto nos toca e nos afecta, trazendo ao de cima emoções profundas e, muitas vezes, difíceis. No entanto, a grande mestria deste tempo não passa por nos tornarmos imunes a tudo isto, estoicos, totalmente racionais ou até insensíveis. Muito pelo contrário, o grande caminho deste tempo é a vivência de todas estas emoções e, com elas e através delas, encontrarmos o propósito maior, o nosso lugar e a nossa voz neste mundo. Sem esse trabalho, somos engolidos pelo mundo exterior e levados a um lugar muito escuro do nosso ser.

Tudo começa em cada um de nós. Tudo ganha forma quando despertamos para quem somos e para o nosso caminho. Tudo floresce e dá frutos quando ganhamos consciência da nossa realidade espiritual, que pouco ou nada tem a ver com fazermos terapias, aprendermos técnicas ou iniciarmos um caminho esotérico, esses são os caminhos, mas sim com a grande aprendizagem do que é, verdadeiramente, Ser Humano. Contudo, esse trilho começa dentro de nós, inicia-se dentro do nosso ser, ganha dimensão quando nos reencontramos com a nossa essência e com o nosso coração, quando a ela alinhamos a nossa mente criadora, não a influenciada pelo ego primitivo e defensivo, mas sim por um Ego elevado, manifestador do divino amoroso, compassivo e esperançoso aqui na Terra.

Quando as estruturas se quebram, parece sempre que nos vai faltar o chão, que vamos perder tudo aquilo que conquistámos, parece que vamos ter de iniciar tudo do zero, como se tal fosse possível! Tudo se transforma e evolui quando, presos numa carapaça que nos impede de crescer, temos a coragem de a partir, de quebrar as máscaras e as armaduras, de rasgar os véus e deixar cair as barreiras. A coragem não é a ausência de medo, mas sim a capacidade de, com ele e através dele, podermos dar um passo em frente na vontade de sermos nós mesmos, é deixarmo-nos guiar pelo nosso coração, não o órgão nem a idealização emocional, mas sim o nosso grande centro energético e crístico. O tempo que vivemos, individual e colectivamente, é um tempo de transformação, é certo, mas é também um tempo que nos pede para sermos corajosos e abraçarmos os nossos caminhos, sem radicalismos, atitudes impensadas ou impulsividade, mas sim num sintonia que só um caminho dentro de nós nos permite atingir

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