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Pedra Basilar

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Na vida, quando observamos com atenção, tudo se processa, se desenvolve e funciona em ciclos e através deles se concretiza, como uma escadaria em espiral que vamos subindo, degrau após degrau. Assim também o é na linguagem da Astrologia, que nos revela e nos mostra o trabalho dos ciclos na sua multiplicidade e integração. Tal revela-nos, também, como a Astrologia é, na sua essência, uma linguagem simbólica da Vida, tão dinâmica quanto os próprios movimentos que esta passagem pela Terra nos apresentam e nos oferecem. Contudo, como tudo o que é profundamente belo, por detrás duma beleza de simplicidade, existem pormenores intrincados e pequenos toques da genialidade do divino que, quando revelados, mostram-nos camadas de conhecimento e sabedoria e inspiram-nos nos nossos passos.

Torna-se retórico e repetitivo dizer que estamos num tempo especial, num momento único e sublime. Podemos até ver como um eufemismo para mascarar a dureza dos desafios que nos estão a ser colocados, individual e colectivamente, mas a realidade é que este é período que necessitamos de olhar com alguma atenção, pois nele estão contidas algumas respostas, algumas compreensões e algumas chaves para podermos trabalhar na nossa vida nos próximos anos. Contudo, para reconhecermos e apreendermos todas essas coisas, precisamos de voltar atrás no tempo, recordarmo-nos de algo que vivemos num tempo relativamente distante, mas crucial para o que hoje se completa.

Os primeiros dias de Setembro são marcados pelo último e fugaz ingresso de Plutão, o mais lento dos planetas que trabalhamos activamente na Astrologia, pertencente a uma classe que chamamos de transpessoais, mas que gosto também de chamar de Alquimistas, no Signo de Capricórnio. Por poucas semanas, até meados de Novembro, o pequenino, mas poderoso, planeta que comporta a energia do senhor dos Submundos, volta ao Signo da frieza do Inverno, da aridez da montanha, para concluir a sua grande, profunda e transformadora passagem e, consequentemente, entregar-nos as suas últimas pérolas.

“O Alquimista”, reconhecido e maravilhoso livro de Paulo Coelho, foi escrito em 1987 e lançado em 1988, quando Plutão fazia a sua passagem por Escorpião, signo do seu domicílio.

Enquanto humanidade, e, para mim, este é um ponto muito importante, foi a primeira vez (e única para quem está vivo) que, conscientemente, tivemos Plutão em Capricórnio. Como é óbvio, o planeta já lá estava e já passou inúmeras vezes pelos domínios do décimo signo do Zodíaco, mas esta foi a primeira em que sabemos que ele existe e está integrado na linguagem Astrológica. No meu entendimento, este facto é muito relevante, pois diferencia esta de todas as passagens anteriores, conferindo-lhe uma consciência, um conteúdo e uma substância que antes não tinha, pois só o conseguimos ver agora, desde 1930, altura da sua descoberta e o momento a partir do qual lhe atribuímos um símbolo e um significado. A última vez que Plutão tinha estado em Capricórnio foi no final do século XVIII, período das revoluções Americana e Francesa. Embora esse tenha sido um período em que identificamos muito bem o teor e a força desta passagem, ela é vivida de forma crua, sem a elevação que a consciência nos permite obter, mas que se torna basilar para a sua devida integração.

Nestas próximas semanas, em que Plutão percorre pouco menos de metade do último grau de Capricórnio entre o seu movimento retrógrado e a mudança para o movimento directo, temos a possibilidade de integrar algumas aprendizagens que os últimos anos nos proporcionaram. Como pequenas, mas importantes, chaves que estão ao nosso alcance, este é o tempo de encaixar peças e compreender o que os últimos anos nos têm impulsionado. Ainda que esta seja uma visão incompleta, pois temos de ter em conta que existem um conjunto de outros movimentos relevantes enquanto Plutão esteve em Capricórnio, focarmos a nossa visão neste aspecto pode ser profundamente revelador, se estivermos atentos e disponíveis para receber a sabedoria que este grande Alquimista tem para nos oferecer.

Colocam-se agora algumas perguntas importantes e interessantes para todos nós. Onde estávamos no início de 2008? O que é que a vida nos estava a apresentar e a solicitar nessa altura? Que estruturas em nós começaram a ruir, que tempestades se abateram sobre nós, que terramotos nos começaram a abalar e, consequentemente, que “montanhas” começaram a elevar-se no nosso ser? Estas semanas que temos pela frente são o fechar dum caminho e o abrir, em definitivo (por dois séculos e meio), de outro, um caminho que começou nesse início de 2008 quando Plutão dava os seus primeiros passos em Capricórnio, anunciando profundas transformações nas estruturas de poder que nos sustentavam.

Recordemo-nos que é durante 2008, neste período entre Sagitário e Capricórnio, que se inicia um enorme e profundo tempo de crise económica, com a queda do Lehman Brothers, nos EUA, arrastando o mundo para tempos muito conturbados. Iniciava-se um período de queda de poderes instituídos, de contestação de estruturas, de revelação da podridão instalada em diversas áreas e instituições. É também nestes anos, até agora, que algumas bases de estruturas sociais se rompem e começam a ruir, abrindo o espaço para que, em Aquário, o poder seja devolvido, com a devida responsabilidade, a quem ele pertence, ainda que, para tal, o desígnio principal destes anos fique mais percebido e cumprido.

Um pormenor muito interessante também é de ter em conta. No início de 2008, na primeira entrada de Plutão em Capricórnio, Plutão teve uma oposição de Marte, em Caranguejo, no primeiro grau dos respectivos signos. Agora, mesmo na recta final de Plutão em Capricórnio, volta a ter uma oposição de Marte, em Caranguejo, agora no último grau dos respectivos signos. Isto pouco teria de especial, tendo em conta que houve várias outras oposições de Marte a Plutão durante estes anos. Contudo, apenas a primeira e esta última, em Novembro, foram, nos seus pontos exactos, em movimento directo, sendo que todas as intermédias foram com Plutão em movimento retrógrado. Em todos os momentos intermédios houve trabalho interior que Marte ofereceu de integração, mas no início e no final, esse trabalho dirige-nos para o exterior, para uma acção, para algo que precisa de ser traduzido para o concreto, num processo de autocuidado, de retorno a nós.

Plutão é um poder profundo que nos é oferecido, uma força interior que precisa de ser lapidada e que, em algum momento, necessitamos de escolher, conscientemente, como usar.

Agora que esta parcela da espiral se começa a completar, é para nós um tempo de revisão e de integração de aprendizagens, pois há muito e importante caminho pela frente para concretizar. Olhando para trás, para o que se iniciou em 2008-2009, em que ponto estamos, o que fizemos e o que estamos a construir? Que estruturas em nós, durante todos estes anos, foram ruindo? E quais fizemos muito esforço para segurar? Será que ainda vale a pena? Será que ainda é preciso? Ou será, tão simplesmente, o tempo de largar e deixar cair, com muito barulho, estrondo e poeira, o que já não nos permite crescer?

Plutão é um poder profundo que nos é oferecido, uma força interior que precisa de ser lapidada e que, em algum momento, necessitamos de escolher, conscientemente, como usar. Contudo, para o fazer, precisamos de caminhar através da sombra, compreendê-la como parte de nós e permitir que ela seja reveladora. O diamante só se torna visível na sua beleza e esplendor quando colocado sobre um veludo negro, pois é essa cor profunda que eleva os traços duma das pedras mais valiosas que a terra formou no meio da destruição, de temperaturas altíssimas e pressão extrema.

Plutão é o poder dessa morte profunda e, em Capricórnio, ela recai sobre as estruturas caducas e bloqueadoras. Foi neste percurso que nos foi oferecida a compreensão das armaduras que, embora necessárias durante algum tempo, agora precisam de ser definitivamente largadas. Foi durante este tempo que pudemos compreender o que ainda nos pesa na caminhada, que fios ainda nos ligam a coisas que já não nos pertencem e, consequentemente, o que é realmente preciso para subir a nossa montanha. O resto, de forma muito consciente, é preciso largar.

Nessa perspectiva e entendimento, este é um momento importante de revisão dos propósitos e objectivos que nos têm regido, mas também do tipo de alimento e combustível que temos utilizado para cumprir a nossa caminhada. É curioso percebermos como o mundo à nossa volta nos mostra estas “pequenas” realidades. Hoje discutimos valores estruturais básicos, vivemos um problema de habitação um pouco por todo o mundo, deparamo-nos com a ganância e a avareza, com as desigualdades, com as guerras por território e poder, enquanto nos movemos dentro duma discussão absolutamente necessária, a das alterações climáticas e da utilização de combustíveis, da destruição que estamos a fazer ao nosso próprio planeta, a nossa primordial casa.

Voltemos por instantes a 2008-2009 e olhemos para quem éramos, para os nossos sonhos e projectos, para as nossas vontades, para o que, nesse momento, vislumbrámos e sentimos que já não podia continuar, que precisava de ser diferente, que precisava de cair, de morrer e renascer. Mesmo sem saber muito bem como o fazer, esse tempo trouxe-nos a ideia de que algo precisava de ser feito, que nada poderia ficar igual, senão poderíamos ficar soterrados sobre os nossos próprios medos, dúvidas e questões.

Em praticamente 17 anos, tanto mudou, tanto aconteceu, à nossa volta e na nossa vida. Hoje, o mundo que nos rodeia, como nós mesmos, nada tem a ver com a realidade desse passado, mas agora é tempo de perceber o que foi uma operação estética, uma maquilhagem, e o que foi uma derrocada profunda que deu origem a um novo edifício. Por isso, este é um tempo de reflexão, de integração e de aprendizagem, que nos coloca nas mãos peças importantes para o futuro. Em Capricórnio, Plutão ensinou-nos, entre tantas outras coisas e duma forma muito generalista, a responsabilidade que temos pelo nosso próprio poder, pela nossa vontade e determinação. É essa chave que estará nas nossas mãos para abrir as portas do tempo que se apresenta à nossa frente. Contudo, nada disto é pacífico nem linear, e nunca o poderia ser nos reinos de Plutão.

Nos domínios do submundo, o julgamento da alma é feito e o seu coração é pesado, como nos mostra o mito egípcio de Osíris, muito identificada, de forma geral, com Plutão. Então, o grande questionamento que precisamos de fazer agora é como está o nosso coração, o que é que ele ainda carrega e que precisa de largar, que feridas ainda estão por sarar. Se necessário, compreender também as escolhas que nos trouxeram até este momento, o poder que escolhemos usar e como o queremos, agora, ter em nós. Nessa consciência, compreender o que é preciso fazer, propormo-nos a trabalhar essas questões e dar os passos que faltam para essa tarefa. Não nos é pedido que o trabalho esteja concluído (nem sequer sabemos muito bem o que é essa ideia de conclusão), mas sim que nos responsabilizemos pelo percurso que temos estado a fazer, pelas nossas escolhas e passos, pois esse é o primeiro passo para o coração poder ficar mais leve. Depois, sim, é tempo de agir, é tempo de fazer, é tempo de abrir a mente e a consciência para a tarefa a que nos propusemos.

Capricórnio é a pedra basilar onde elevo a minha casa, onde inscrevo o meu legado, o cumprimento do nosso propósito individual que, depois, se projecta para o mundo que me rodeia. Quando Plutão passou pelos domínios deste signo, ele levou-nos, muitas vezes, a rendermo-nos perante a nossa própria vida, perante o que não temos controlo nem domínio, a submetermo-nos conscientemente a um poder maior que nós mesmos, ajoelhando-nos perante o nosso próprio destino, mas nunca como seus escravos e sim como seu discípulo. É a consciência desta dimensão que carregaremos nas nossas mochilas pelos próximos tempos e pelo caminho que temos pela frente. A mochila levará mais coisas consoante o trabalho que andámos e andaremos a fazer em nós mesmos, mas, na verdade, isso só a torna mais leve, pois o caminho pedirá todas as ferramentas e, com elas, tornar-se-á mais simples de percorrer. Sem elas, a mochila pode ser inicialmente leva, mas o caminho torna-se mais pesado, difícil e duro. Ainda assim, com vontade, amor e determinação, também o faremos. Nos últimos anos, foi-nos proposto e incentivado muito trabalho sobre a sombra, e em alguns pontos passámos a vivê-la numa ideia constante e quase obsessiva, mas também é o tempo de nos questionarmos algo importante. Se passamos o tempo a olhar para a sombra, a procurar mais o que trabalhar, que feridas ainda estão abertas, que pontos em nós estão imperfeitos, como poderemos ver a luz que está à nossa frente?

Este, na realidade, é sempre um caminho de profundo amor, como nos revela simbolicamente a imagem mais nítida que tivemos de Plutão até agora. A maior transformação que podemos fazer sobre nós só pode ter por base a vibração do Amor. Sem ele, tudo é seco e efémero, desprovido de sentido e de propósito. Com ele, tudo nasce, floresce e dá frutos, mesmo nas condições mais adversas. O maior acto de amor que podemos ter para connosco é largar o que nos pesa, deixar para trás o que nos impede de revelar a nossa própria essência. É nessa atitude que nos redescobrimos e revelamos o nosso enorme poder, não o corrompido ou viciado pelas coisas da matéria, mas aquele que, enquanto espíritos encarnados, existe em nós. É nesse poder que transformamos tudo o que tocamos, que transformamos o chumbo em ouro, que levamos luz onde antes as sombras habitavam, começando, primeiro e acima de tudo, por nós mesmos.

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Comments (1)

Adelaide Francisco

Muito interessante e esclrerecedor o texto. Acrescentou. Obrigada

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